RESUMO - EJA: EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS COMO PRÁTICA DE LIBERDADE
Maria Elizete Guimarães Carvalho*
Emmily Daiane da Silva; Francisco Ribeiro Viana
*UFPB - E-mail: emmilyeds22@gmail.com
A partir da concepção de que o indivíduo é um ser social inacabado, portanto carente da interação social para a construção de seu projeto de humanização, configura-se a educação como a grande mediadora deste processo. Com fundamento nessa concepção, este estudo tem como objetivo discutir a Educação de Jovens e Adultos à luz da Educação em Direitos Humanos que com sua abrangência, compreende em seu cerne diversos procedimentos educacionais, balizados por ideias que visam a autonomia do sujeito e a construção de uma cultura de respeito aos direitos humanos. A importancia e a urgência de discutir e de educar em e para os direitos humanos mais do que nunca, se torna imperiosa. A partir de análises de conjuntura da realidade atual, somos conduzidos a perceber que a prática de uma pedagogia que contribua para a conscientização do sujeito é o caminho para um futuro de respeito aos direitos humanos e ao planeta, configurando-se tal pedagogia como mediadora de conflitos através do diálogo. Como desenvolvimento do trabalho, em um primeiro momento, será apresentado o caminho metodológico percorrido. Em seguida, como fundamentação teórica, serão apresentadas algumas concepções, tendências e perspectivas da EDH, assim como uma conceituação acerca da EJA - Educação de Jovens e Adultos. Como resultados e discussão será apresentada a experiencia de educação popular Quarentas Horas de Angicos/RN, como exemplo de uma prática educacional exitosa, baseada no respeito às pessoas como sujeitos de direitos. E por fim, seguirão as considerações finais. O nosso estudo encontra-se fundamentado em Freire (2011), Lyra (1996), Mara (2013), e nas reflexões de Carvalho (2012), entre outros. O que se espera desse estudo é que ele possa contribuir de alguma forma para uma reflexão crítica acerca de uma educação que não esteja subjugada aos ditames do mercado, que valorize os sujeitos e o planeta, como casa de todos e todas, igualmente. Priorizando os temas centrais deste estudo, o trabalho se deu a partir da pesquisa qualitativa, apropriando-se de fontes bibliográficas. Para isso foi realizado um levantamento de livros e artigos acadêmico dando prioridade ao contexto autoral da própria Universidade Federal da Paraíba. Buscamos na biblioteca Central da UFPB e em sites confiáveis as fontes necessárias para a elaboração do trabalho. Essa fase foi sucedida de leituras, discussões, análises e sistematizações. Circunstanciado pelo horizonte histórico cultural, este trabalho parte da concepção de que o ser humano nasce humano e ao longo de sua existência, numa perspectiva de construção e desconstrução, enquanto projeto existencial, vai se humanizando, e essa realização acontece mediante sua interação com o meio. Nesse sentido, compreendemos que para isto vir a ocorrer, a educação configura-se como mediadora. Dito isto, compreendemos que um dos caminhos, que como prática, contribui incisivamente para essa humanização é a EDH, uma vez que assume como seu papel fundamental a compreensão e a aplicação dos direitos humanos. Diante do exposto, educar para os direitos é um grande desafio, pois a EDH contrapõe-se às estruturas sociais atuais, que baseadas numa lógica de mercado, se manifestam frequentemente na forma de exclusões, discriminações, violações, desrespeitos às diferenças, ignorando a dignidade do ser humano em sua história e formação. Em detrimento dessa realidade, a história vem mostrando que a luta pela defesa da dignidade humana, através da educação, tem ocupado espaços. Exemplificando, é válido fazer uma alusão à década de 1960, mais precisamente ao ano de 1963, que foi fortemente marcada pelo surgimento das reformas de base, que traziam como alicerce uma mobilização popular tanto em relação ao Campo, tomando como exemplo as lutas pela reforma agrária feitas pelos Sindicatos Rurais e as Ligas Camponesas, como também os movimentos pela educação popular, a qual no desenvolvimento das iniciativas para uma alfabetização de jovens e adultos destacaram-se em Natal a campanha criada pelo prefeito Djalma Maranhão “De Pé no Chão Também se Aprende a Ler”, em João Pessoa-PB a campanha de Educação Popular (CEPLAR) e a emblemática pedagogia dialética desenvolvida em Angicos cujo idealizador é conhecido como Paulo Freire. Nesse sentido, elucida Lyra (1996) que: No início da década de 60, vivia-se no Brasil um clima de entusiasmo e a esperança de um tempo de liberdade e desenvolvimento. O país se industrializava e modernizava. Brasília, a nova capital. A seleção ganhará a Copa do Mundo (1958). O cinema, o teatro e a literatura florescem. A bossa nova revoluciona a concepção da música brasileirismo [...]. (LYRA, 1996, p. 14). Sendo assim, é importante analisar que o próprio contexto da época favorecia para o desenvolvimento das mobilizações das camadas populares, e por isso foram surgindo esses movimentos voltados para a educação, que tinham como cunho primordial a alfabetização de jovens e adultos. Remetendo-se a experiência de educação popular que ficou conhecida não só “o Brasil, mas internacionalmente, como 40 Horas de Angicos, é válido elucidar a importância da rememoração do projeto idealizado por Freire, o qual visava não apenas a alfabetização, mas também a conscientização de uma população marginalizada da sociedade da época.” A luz dessas reflexões, pode ser atrelada a essa linha de pensamento uma das importantes influências e heranças da educação de Paulo Freire na atualidade, que se refere ao EJA (Educação de Jovens e Adultos), o qual seguindo a concepção de Mara (2013), surgiu em base ao fim do Mobral em 1985,visando à alfabetização de jovens e adultos, porém sem a utilização da pedagogia dialógica de Freire, que:”[...] Deu lugar para a Fundação Educar, que apoiava a alfabetização de EJA. Com a promulgação da constituição de 1988 o estado aumentou o seu compromisso com a educação de jovens e adultos. Na década de 1990 incumbidos pelo governo ocorreram parcerias entre Ong’s (organizações não governamentais), municípios, universidades, grupos informais, fóruns estaduais e nacionais, em prol de melhorias da educação de jovens e adultos, sendo a EJA registrada e intitulada como “Boletim de ação Educativa” (MARA, 2013, p. 18). Assim, o mesmo define-se como uma modalidade de ensino amparada por lei que abrange aqueles indivíduos que por algum motivo não tiveram acesso a um ensino regular na idade adequada. Nesse sentido, o objetivo central do EJA é solucionar ou amenizar algumas questões sociais como a marginalização e a exploração daqueles indivíduos que por não terem tido acesso à educação, se sentem e são excluídos da sociedade, ou seja, é uma proposta que favorece a inclusão econômica, social e política dos indivíduos. Por esse viés, é importante ressaltar o papel do professor que na modalidade EJA é colocado como um mediador da pedagogia dialógica que gera a curiosidade e instiga o aluno a problematizar a sua realidade, para que ele consiga relacionar o seu cotidiano com o que está sendo estudado em um processo em que a conscientização vem primeiro que a alfabetização mudando totalmente a visão do trabalhador que começa não apenas a ser enxergado, mas a enxergar-se como um trabalhador/cidadão. Nesse sentido, apontamos como exemplo bem sucedido de experiência de Educação em Direitos Humanos, o Projeto de educação popular desenvolvido no Rio Grande do Norte em 1963, conhecido como Quarentas Horas de Angicos. Nele, podemos identificar saberes e práticas que estimularam comportamentos de justiça, equidade, respeito e paz. O projeto de Angicos foi desenvolvido não apenas para reduzir o índice de analfabetismo, que já se encontrava em torno de aproximadamente 70% nessa região, mas principalmente, para proporcionar que essa população pudesse se tornar participante na sociedade, visto que a partir do acesso aos debates e às formas de conhecimento apresentadas, ela iria desenvolver sua capacidade de reflexão a partir do senso crítico, ou seja, não seria mais considerada como “massas”, mas por outro lado, estaria atuando como cidadã na sociedade, tendo voz, questionando e sendo ciente dos seus diretos de cidadania. Entretanto, face a esse projeto educacional, foram surgindo vários questionamentos que se embasavam em uma questão - Como chamar de projeto educacional, um projeto em que os participantes ao final do percurso sabiam apenas escrever frases curtas? - E a resposta a essa indagação encontra-se justamente na intenção do projeto, pois como já foi explicado anteriormente, a intenção além de educar e alfabetizar era a de conscientizar os indivíduos participantes, de forma que eles não se sentissem mais excluídos da sociedade letrada e assim, a partir do pensamento crítico desenvolvido, pudessem exercer sua cidadania, mudando totalmente a visão que se tinha dessa população que antes era analfabeta e vista como uma “massa” única e agora seria percebida como cidadã participante das decisões da sociedade. Esse desenvolvimento do senso crítico do indivíduo que gera sua capacidade de reflexão se dá a partir da inovação da proposta trazida pelo método de Paulo Freire(2010), numa perspectiva de educação problematizadora, somada a uma ação política e cultural para a liberdade, fazendo uso dos círculos de cultura como elemento principal do processo de ensino-aprendizagem. Em relação a isso, pode ser feita uma alusão às escolas tradicionais, nas quais são colocadas as cartilhas como elemento fundamental do processo de aprendizagem, da visão que se tem do professor como um ícone dono de uma verdade única, imutável e absoluta, além da visão que também se tem do aluno que é visto como bloco único e homogêneo, cuja função é apenas ser um receptáculo de informações, reproduzindo sempre aquilo que o professor dita como correto. É nesse sentido que o método utilizado por Freire nos círculos de cultura, em que as salas de aula eram vistas como um espaço onde era desenvolvido o debate que dava origem ao processo de alfabetização e conscientização, em que os alunos aprendiam a discutir sobre assuntos relevantes do seu cotidiano, aprendiam a questionar, modificar e renovar, colaborando assim para a emancipação própria e da sua conscientização política. Assim, os alunos não eram vistos mais como um receptáculo de informações e tão pouco como um bloco de massa homogênea, mas começavam a ser enxergados como cidadãos e como pertencentes de um todo capaz de melhorar a realidade a partir da capacidade de refletir. Então, surgia uma nova configuração da instituição escolar, onde as experiências dos alunos eram colocadas como fundamentais para o desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem, em que pela primeira vez os conteúdos ministrados pela escola ultrapassavam seus muros e refletiam na realidade. Era uma espécie de educação não apenas voltada ao contexto escolar, mas voltada para a vida. É justamente por essa proposta ser de caráter emancipatório, assumindo características de uma educação voltada para os Direitos Humanos, que proporcionam a capacidade de reflexão ao indivíduo, que ela foi destruída logo no início da ditatura militar. Nesse momento, atentamos para a realidade da nossa sociedade, que tem se configurado pelos princípios da classe dominante, em que o trabalhador é considerado como objeto, cuja única função é ser explorado para gerar valor e para que isso ocorra, ele não poderá ter consciência e nem tão pouco capacidade para refletir. Por isso, muitos participantes dos Círculos de Cultura sentiam-se amedrontados pela repressão que sofriam, sendo obrigados a queimar todo o seu material, visto que o projeto conhecido atualmente como 40 Horas de Angicos ameaçava a hierarquia e a ordem vigente na época. Portanto, é notório que o projeto conhecido como 40 Horas de Angicos, desenvolvido a partir do método cujo mentor foi o professor Paulo Freire, possuiu no passado e ainda possui total relevância na sociedade atual do século XXI. Considerando que o projeto representava não apenas uma forma de alfabetização, mas também uma via de conscientização e produção da consciência crítica do indivíduo, buscou desenvolver a capacidade de pensar, questionar e refletir acerca dos aspectos vigentes da sociedade, o que o coloca como uma experiência em e para os Direitos Humanos. Nesse sentido, influenciou a criação do EJA, como uma perspectiva libertadora que traz ao indivíduo analfabeto, sendo ele jovem ou adulto, uma perspectiva de saída da obscuridade da falta de conhecimento, ou seja, contribuiu para a transformação de indivíduos assujeitados em sujeitos conhecedores dos seus direitos e deveres, portadores de cidadania.
Palavras-chave: Educação; Direitos Humanos; Quarenta Horas em Angicos;
Olá boa tarde, Maria e Emmily,
ResponderExcluirQual o recorte temporal da pesquisa mediante o levantamento de livros e artigos acadêmico publicados na Universidade Federal da Paraíba? O que seria um indivíduo politizado, por exemplo, para os coordenadores dos Círculos de Cultura? Como analisa as contribuições da obra freireana para a educação mediante as políticas educacionais atuais?